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terça-feira, 10 de novembro de 2009

Sai primeiro relatório da comissão ambiental sobre os impactos causados ao meio ambiente pelas ações das empresas em Mucuri


10/11/2009
Saiu o relatório preliminar do laudo final ainda a ser divulgado, elaborado pela equipe científica formada por peritos especializados em impactos ambientais, instalada pela Câmara Municipal de Mucuri, cujo mentor foi seu presidente Agripino Botelho Barreto (PR), com missão distribuída para os vereadores Roberto Alves dos Santos (PSC), Wilson Pereira Cabral (PR), Márcio de Jesus Machado “Marcinho” (PDT), Roberto Correia Bastos “Nicó” (PSC), Manoel Negino Cruz (PSDB), Justina Souza Cruz “Tina” (PMDB), Carlos Gonçalves de Souza “Tazinho” (PSDB), e Giselle Gazzinelly (PTB), que formaram com outras pessoas de organismos sociais e ambientais, uma comissão ambiental que atualmente assumiu a tarefa de contrapor as ações de grupos empresariais que atuam no município, objetivando preservar e salvar o meio ambiente em Mucuri.

Para a elaboração deste relatório, a professora da Universidade Federal do Mato Grosso, Luciene Maria Kassar Borges, que é mestre em biologia, contou com a participação do técnico de fiscalização ambiental Epaminondas Dias Junior, o biólogo e fiscal ambiental Ronaldo Morais dos Santos, o historiologo e ambientalista Roque Vieira dos Santos, o biólogo e perito judicial ambiental Antônio Carlos Martins Filho, o turismologo especialista em gestão ambiental e perito judicial ambiental Fábio Pontes, o professor e mestre em biologia Marconi Souza Silva, da Universidade Federal de Lavras e com o secretário municipal de Meio Ambiente, o especialista ambiental Leilio Maximon Teixeira Alves.
Por Athylla Borborema
RELATÓRIO DE ATIVIDADES RECONHECIMENTO PRELIMINAR DOS PRINCIPAIS PROBLEMAS AMBIENTAIS DO MUNICÍPIO DE MUCURI, EXTREMO SUL DA BAHIA. LUCIENE MARIA KASSAR BORGES MUCURI – BA Novembro/2009
1. INTRODUÇÃO
O município de Mucuri, situado no extremo Sul baiano, reflete as grandes mudanças no desenvolvimento brasileiro, frente à dinâmica competitiva e globalizada economia mundial, que transforma rapidamente as paisagens, as relações sociais e econômicas de uma região. Como exemplo, as mudanças que ocorrem na região de Mucuri após o reflorestamento, nas duas últimas décadas, de extensas áreas cultivadas com eucaliptos e a conseqüente instalação de atividades industriais na produção de celulose e papel. Com a crescente demanda mundial desses produtos e as condições favoráveis no trato silviculturais locais, a indústria deste setor encontrou na região, um meio favorável para expansão de seus negócios.
De acordo com os estudos feitos por Oliveira (2008) e Souza Neto (2007), o cenário agrícola do município na década de 50 era dominado por grandes áreas de cultivos do cacau e outras atividades agrícolas, como: café, cana, pecuária e o desmatamento indiscriminado da floresta nativa original para suas implantações. Na época, o cultivo do cacau representava até 82.2% do total de culturas perenes da produção agrícola do município (VIEIRA FILHO apud SOUZA NETO, 2007).
A partir de 1990, com o declínio da produção do cacau, devido aos problemas fitossanitários e a baixa cotação do produto no mercado internacional, houve ao longo da década uma grande migração dessa cultura para o plantio de eucalipto que se estabeleceu na região. Esta rápida mudança do cenário sócio-econômico veio agravar ainda mais alguns setores da já fragilizada economia regional. Então, a ausência de políticas públicas adequadas e o aumento de incentivos fiscais aos programas governamentais à implantação de grandes empresas do agronegócio papel e celulose, vem promovendo um processo em alguns casos irreversíveis às condições sócio-econômico-ambientais do uso e ocupação dos territórios do Sul da Bahia (SOUZA NETO, 2007; VIEIRA FILHO apud SOUZA NETO, 2007; OLIVEIRA, 2008). Para Oliveira (2008) uma conjuntura de fatores favoráveis atraiu esse tipo de investimento à região, tais como: condições climáticas, condições edáficas, depreciação das terras locais e, principalmente, políticas públicas de incentivos e financiamentos voltados a este setor industrial.
O Brasil, nos últimos anos, vem se destacando como um dos maiores produtores e exportadores de celulose e fibra curta de eucalipto, em especial o extremo Sul da Bahia, onde o pólo industrial de Mucuri é um dos mais expressivos neste setor. No município, está instalada a Unidade Mucuri da empresa SUZANO Papel e Celulose, cuja fábrica entrou em operação em 1992 e recentemente teve sua capacidade produtiva ampliada para mais de 1.8 milhões ton.anoˉ¹. Sozinha ela é responsável por 60% dos impostos municipais, sendo uma das maiores arrecadações do Estado da Bahia. Hoje, a monocultura de Eucaliptus spp. Está presente em quase 65% das propriedades rurais agricultáveis, os fazendeiros da região recebem incentivos para o plantio, através de sistemas de parcerias do Programa de Fomento para a expansão das áreas plantadas (OLIVEIRA, 2008).
Como este setor específico da silvicultura necessita de vastas extensões de terra, as empresas de reflorestamento adquiriram grandes quantidades de propriedades rurais para suprir suas necessidades básicas, promovendo com isso a concentração fundiária, isso tem gerado conflitos agrários e ambientais de várias naturezas, como apropriação de terras públicas, usos ilegais de Áreas de Preservação Permanentes (APP’s) e Reserva Legal (ARL’s). Outros empreendimentos agrícolas também têm contribuído para esse cenário, é caso do avanço da pecuária extensiva, tecnificação da cultura do mamão para exportação e outras culturas de menor expressão (cana, café, cacau, abóbora, melancia e mandioca).
Os dados de recenseamento do IBGE (2007) vêm demonstrando que o êxodo rural tem aumentado na região de Mucuri, desde o início da década de 90, a população urbana aumentou cerca de 50%, especialmente observado no distrito de Itabatã. Lamentavelmente, este fato parece estar relacionado aos efeitos diretos e indiretos de grandes sítios de reflorestamento no entorno de áreas urbanas, contribuindo também, pela competição dos espaços urbanos no processo de favelização, perda da biodiversidade in situ, desemprego, prostituição infantil e o consumo de droga. Certamente, era esperado pelo setor público que alguma mudança mais significativa ocorreria no cenário futuro municipal com a chegada de empreendimentos desta natureza, ainda mais se considerando que não houve ações preventivas de planejamento regional anteriores aos investimentos no município.
Por outro lado, Oliveira (2008) ressalta os impactos positivos dos investimentos do setor Papel e Celulose trouxe a região, como: aumento do PIB, maior arrecadação de impostos municipais, melhoria das infra-estruturas regionais e a inserção do País em novos mercados internacionais. É inegável que houve uma melhoria da qualidade de vida da comunidade e da economia regional em vários setores, entretanto, a realidade do que se pode observar é que a cidade de Mucuri e sua zona rural continuam empobrecendo cada vez mais. É inadmissível com a tecnologia conquistada no século XXI e os recursos provenientes de um investimento desta monta, porque, tanto os setores privados e públicos não previram inicialmente os planejamentos e os investimentos necessários ao novo modelo econômico almejado.
Os programas de fiscalização, monitoramento, compensação e medidas mitigadoras apresentam alto custo de implantação e de rotinas laboratoriais. Assim, o sucesso para a implementação destes programas representa um grande desafio de confiança e parceria entre a Empresa & Poder Público, bem como, o devido acompanhamento pelo Ministério Público (MP) e a sociedade organizada.
Neste contexto, recebemos um convite da presidência da Câmara dos Vereadores do Município de Mucuri – BA para uma rápida visita de reconhecimento in loco dos principais problemas sócio-ambientais que vem ocorrendo na região em tela.
2. OBJETIVOS
Dentre os objetivos relacionados às atividades efetuadas em campo, no período entre 12 e 16 de outubro de 2009, podemos citar:
Levantar a literatura e o nível de informações básicas disponíveis do background regional relacionadas às implicações sócio-ambientais;
Realizar visitas e entrevistas com fontes orais locais dos sítios mais comprometidos ambientalmente, como:
- Conhecer a logística de transporte dos produtos florestais entre as unidades de produção e fabris;- Áreas de Preservação Permanentes/ APP’s e Reservas Legais/ ARL’s, relativas a manguezais, restingas, rio Mucuri, áreas do reflorestamento e zonas de conflito no entorno as zonas urbanas e sítios naturais;- Áreas do litoral marinho;- Conflito de usos das propriedades rurais fomentadas e unidades de produção tradicionais;- Áreas com assoreamento e solapamento de margens da planície aluvial do baixo rio Mucuri;
Conhecer a realidade da pesca marinha e estuarina na região;
Conhecer a realidade do comércio local e o potencial turístico;
Realizar um sobrevôo para melhor compreensão da realidade terrestre e tomada de imagens aéreas dos sítios ameaçados;
Levantar as informações dos projetos da barragem e do monitoramento ambiental da UHE Santa Clara, no médio rio Mucuri;
Conhecer os programas de controle utilizados pela CIA SUZANO Papel e Celulose no uso de fertilizantes e defensivos agrícolas e no tratamento dos efluentes industriais;
Realizar uma visita a Câmara de Vereadores para conhecimento dos problemas ambientais e discussão de uma proposta de Pré-projeto de Diagnostico Ambiental Rápido Regional;
Participar de reunião técnica e visitar a fábrica Cia Suzano Papel e Celulose.
3. RESULTADOS E RECOMENDAÇÕES PRELIMINARES
3.1 Das rodovias:
Durante a viagem de carro (ida e volta), entre as cidades de Vitória – ES e Mucuri – BA, pelas BR 101 e BA 698, foi possível observar um intenso fluxo de caminhões que escoam a produção de toras de Eucaliptus spp. das áreas de plantio até a fábrica em Mucuri. A BR 101 apresenta vários trechos em precárias condições de conservação, causando grandes riscos de acidentes aos usuários. Segundo informações colhidas de informantes locais, já existem reivindicações das comunidades locais para duplicações dos trechos com maiores índices de acidentes e melhoria da infra-estrutura da rodovia. Pode-se levantar também em mais de um ponto da rodovia, solicitações de um estudo de viabilidade técnica sobre a construção de trechos ferroviários (cerca de 150 km de linhas), interligando a malha ferroviária existentes entre as cidades de Valadares – MG e o porto de exportação em Tubarão – ES, através de financiamento com recursos público e/ou empresarial. Devido aos problemas citados acima ficou evidente a enorme frustração da sociedade local com os descasos das autoridades competentes dos problemas mencionados.
3.2 Das visitas a zonas de conflitos entre áreas urbanas municipais e áreas intangíveis de ecossistemas naturais:
Com o crescente êxodo rural para as áreas urbanas de Mucuri tem aumentando sobremaneira a pressão sobre as Áreas de Preservação Permanentes/ APP’s, este fato vem criando vários problemas para a cidade, principalmente os de ordem social, ambiental e da defesa civil. No dia 12 de Outubro, realizamos uma visita aos bairros “Bigorral” e Jardim Califórnia na cidade de Mucuri, onde para nossa surpresa se pode constatar a mais bizarra das situações. Ambos os loteamentos foram motivados por invasões de populações pobres vindas das áreas rurais, que lotearam indiscriminadamente zonas de influência de manguezais e restingas, ambas salvaguardadas por Lei Federal (Código Florestal Brasileiro, 1965), todavia, o mais intrigante é que a Prefeitura local embora sabendo da ilegalidade das invasões, providenciou o asfaltamento dos bairros.
Situações como esta são amplamente conhecidas e registradas em muitas outras cidades do litoral brasileiro, sabemos na maioria das vezes que essas invasões estão relacionadas com os processos sociais envolvidos na favelização das cidades. Uma cidade moderna controla e normatiza o uso desses conflitos através de seu Plano Diretor, onde são estabelecidas as zonas propícias à expansão da cidade. Na cidade de Mucuri ainda se observou outras irregularidades e a total ausência dos poderes públicos locais, Estaduais ou Federais, impedindo novas áreas de loteamentos em zonas estuarinas do rio Mucuri, orla marinha e nos sistemas naturais de drenagens dos manguezais peri-urbanos. Essas zonas da orla marinha são conhecidas como “Áreas de Marinha”, portanto pertence à União e estão sujeitas a ações judiciais de embargo com desocupação imediata das áreas. Temos conhecimento que a Prefeitura de Mucuri já tem uma versão preliminar do Plano Diretor da cidade, com indicações de suas áreas de expansão, o que facilitaria em muito no ordenamento e realocação desses moradores aos novos loteamentos em áreas legais.
Talvez, a situação mais alarmante verificada in loco foi à ocupação de muitos quilômetros de litoral da orla marinha, causando grande prejuízo à infra-estrutura e economia municipal, como: a erosão de ruas, lotes, comércios e imóveis em geral. A conservação e revitalização de sítios naturais do supra e meso litoral envolvem um grande esforço por parte da municipalidade, poder público e do setor privado, carecendo ainda de técnicas especializadas de várias áreas do conhecimento, como: engenharias civil, hidráulica, sanitária-ambiental, oceânica, offshore, geotecnia e ecologia marinham estuarinas. Existem antecedentes históricos de narradores orais entrevistados que o fenômeno da “transgressão marinha – TM” observado em alguns pontos da orla vem se agravando mais intensamente, nas três últimas décadas, com a ocupação desordenada de vales da bacia hidrográfica do rio Mucuri e de relevos residuais da Formação Barreira, no extremo Sul da Bahia. Sabemos que os problemas relacionados as “TM” são bem mais complexos do que pensamos, usualmente eles estão relacionados ao abatimento de zonas litorâneas e/ou mudanças climáticas continentais (derretimento das calotas polares, com elevação dos níveis médios do Atlântico Sul).
Pode-se constatar a iniciativa da Prefeitura Municipal na construção de “Moles de Contenção”, próximo a foz do rio Mucuri na tentativa de minimizar os efeitos da erosão marinha na orla da cidade, embora os resultados até agora se mostrem preliminares.
Não dispomos de uma base de dados sistematizados sobre informações ambientais da bacia do rio Mucuri e da Plataforma Continental (e.g., climatológicas, limnológicas, hidrossedimentométricas, fluviométricas, batimétricas e tidológicas - planície de maré/ maré metereológica), que nos permitam fazer maiores considerações sobre as causas e efeitos dos processos erosivos que hora se agravam em toda orla marinha do município. Muito embora, é notório o crescente assoreamento da bacia do rio Mucuri, causados pelos desmatamentos de APP’s, ARL’s, incremento das áreas de plantio e pastagens em topografias desfavoráveis, intensificação da perda de solo por erosão laminar e a falta de assistência técnica adequada; como atestam os estudos realizados sobre os efeitos do desmatamento na bacia do rio Mucuri (FERNANDES FELIPPE et al, 2009; BUENO et al, 2009). 3.3 Do sobrevôo – APP, ARL, Hidrografia, Reflorestamento, Propriedade tradicionais, Ecossistemas ameaçados, UHE e Entre outras:
Na manhã do dia 13 de Outubro nos reunimos com os Senhores Agripino Botelho Barreto (presidente da Câmara Municipal) e Joaquim de Almeida Bernardo (Controlador Geral), quando buscamos as orientações necessárias ao desenvolvimento das atividades em campo. Dentre essas, ficou acertado um sobrevôo inicial para reconhecimento da realidade terrestre e registro de imagens dos sítios ameaçados. Esta iniciativa só foi possível graças ao empenho pessoal do Sr. Agripino Barreto.
A rota pré-estabelecida foi iniciada no aeroporto de Nanuque – MG, ao longo do rio Mucuri até seu estuário, na cidade de Mucuri – BA e, seu retorno se deu sobrevoando a rodovia BA 698, até ao aeroporto.
Na rota de vôo realizada, iniciamos pelo aterro municipal (lixão) – abandonado, que se encontra em área de influência de manancial hídrico, muito próximo a microbacias de captação do rio Mucuri, inclusive há suspeitas de comprometimento dos aqüíferos de sub-superfícies. Com os problemas sócio-ambientais gerados no local e áreas de entorno deve-se em caráter imperativo providenciar a realocação deste para outro sítio indicado por estudos específicos.
No percurso que fizemos sobre o curso inferior do rio Mucuri se observou muitos bancos de areia e solapamento das margens, devido ao sério assoreamento da bacia, baixa representatividade espacial das Áreas de Reservas Legais/ ARL’s e o comprometimento significativo das Áreas de Preservação Permanentes/ APP’s, principalmente as Florestas de Galeria em muitos de seus tributários. Nos casos observados onde ainda ocorriam APP, esta se restringia a estreitas faixas de cobertura florestal antropizadas, a revelia do que está estabelecido no Código Florestal Brasileiro (Lei 4771/ 1965) e nas Resoluções do CONAMA 302 e 303/ 2002; em alguns sítios observamos o avanço ilegal dos plantios de Eucaliptus spp. Sobre as Matas Ciliares. Na região estuarina do rio Mucuri são ainda mais marcantes os efeitos do assoreamento, com grandes extensões de bancos de areia, aterros e sistemas de drenagens ilegais para loteamentos privados em áreas de manguezais e o desmatamento da vegetação nativa para uso das populações ali assentadas.
De acordo com as informações obtidas de moradores locais, o assoreamento do rio Mucuri é um problema antigo, certamente é o resultado de impactos ambientais advindos de áreas a montante ao município, em muitos dos tributários formadores da bacia que nascem nas terras altas dos Planaltos e Depressões de Minas Gerais. Essa mesma situação é similar àquela encontrada no rio Jequitinhonha, que também apresenta suas cabeceiras no Estado de Minas Gerais e sua foz na cidade de Belmonte, Bahia (GASPARINI & BORGES, 1998).

No sobrevôo, subindo o rio Mucuri até a UHE Santa Clara, nas imediações da divisa dos Estados de Minas Gerais e Bahia, pode-se observar o status de conservação das terras neste trecho, onde o mosaico paisagístico dominante é caracterizado por muitas áreas de pastagens extensivas, maciços florestais reflorestados com Eucaliptus spp. polígonos isolados de remanescentes da “Floresta de Tabuleiro”, capoeiras consorciadas com lavouras de cacau, outras culturas perenes e anuais e, faixas interrompidas de APP. Chamou-nos a atenção a total despreocupação e ilegalidade da grande maioria das propriedades rurais com a questão da obrigatoriedade das ARL e da conectividade entre sítios Florestados – Reflorestados – APP – ARL.
Sobrevoamos também a área das margens do reservatório e das propriedades rurais no entorno deste, novamente ficou caracterizado o descaso ao descumprimento das leis ambientais vigentes, aparentemente nas margens do reservatório e nas drenagens constatamos poucas irregularidades no que tange as APP, entretanto, nas áreas de interflúvios o cenário é igual ao observado acima para os trechos analisados do médio e baixo rio Mucuri.
Resumindo, o que se pode constatar é o descumprimento das leis ambientais para APP e ARL e o descaso generalizado do poder público no controle da manutenção de conectividade entre os raros fragmentos de matas nativas e as áreas protegidas por Leis Federais e Estaduais, conforme atestam os estudos sobre a dinâmica de desmatamento na bacia do rio Mucuri (FERNANDES FELIPPE et al, 2009). Os autores concluíram ainda, que hoje só restam 20% da cobertura vegetal original e com uma taxa de incremento de desmate de 1.5% ao ano é preocupante a integridade genética e física desses fragmentos dentro de um cenário para os próximos 20 anos.
No final do sobrevôo foi observada a área onde está instalada a planta de beneficiamento da SUZANO Papel e Celulose e demais instalações fabris, chamando atenção uma área buffer no entorno das instalações. Procuramos saber do que se tratava e nos informaram que a empresa está recuperando a área e estabelecer uma Reserva Particular de Patrimônio Natural/ RPPN, como Unidade de Conservação local. Porém, não souberam nos informar se a empresa já iniciou os estudos prévios exigidos pelo IBAMA necessários a elaboração do Plano de Manejo da categoria RPPN.
Para maiores considerações sobre a barragem da UHE Santa Clara, no que diz respeito a causas e efeitos dos impactos gerados é necessário o acesso a documentação de licenciamento do empreendimento (EIA/ RIMA) e os projetos básicos ambientais (PBA) subseqüentes solicitados ao empreendedor durante o processo de monitoramento ambiental, na fase da licença de operação (LO).
3.4 Da visita à Câmara dos Vereadores de Mucuri:
Na noite do dia 13 de Outubro houve uma reunião na sede da Câmara Municipal de Mucuri onde foram feitos as devidas apresentações com os vereadores, discussões dos problemas sócio-ambientais que preocupam a sociedade local e conversamos sobre alguns procedimentos da proposta de levantamentos dos problemas relatados, a saber:
Para tanto, nesta primeira etapa dos levantamentos a campo foi acordado que o trabalho será constituído de três (03) partes inicialmente:
A primeira delas se reporta a presente resenha com os relatos preliminares do que se pode observar neste inventário expedito do município;
A segunda parte dos trabalhos consistirá de uma agenda de ações emergenciais que nortearão a Câmara Municipal, Prefeitura local e sociedade organizada, estes serão detalhados e entregue após a divulgação destes resultados;
A terceira parte será a elaboração de uma proposta de pré-projeto dos estudos e diagnósticos necessários ao acompanhamento dos trabalhos propostos. Esta etapa será detalhada mais tarde pela equipe conforme as demandas futuras.

Da visita à fábrica Suzano Papel e Celulose:
De acordo com as informações oficiais da CIA. SUZANO Papel e Celulose, a empresa possui desde 1996 as seguintes certificações: a ISO 14001 (gestão eficaz dos aspectos ambientais), o FSC (manejo florestal responsável) e a ISO 9001 (qualidade dos processos e produtos) e, ainda a OHSAS 18001 (segurança e saúde ocupacional), que atestam a responsabilidade social e ambiental da empresa.
No dia 14 de Outubro a Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Vereadores solicitou uma reunião técnica com os representantes da CIA SUZANO Papel e Celulose e da sociedade civil local. O objetivo desta reunião foi conhecer os procedimentos, normas técnicas e funcionamento da empresa. Este esclarecimento foi detalhado pela consultora ambiental contatada CEPEMAR – ES, que em conjunto com diretores da fábrica, procuraram elucidar as dúvidas levantadas. O Dr. Renato Rodrigues de Souza, gerente de projeto da Cepemar apresentou os dados de monitoramento dos parâmetros físico-químicos e biológicos da água do rio Mucuri, obtidos no ano de 2008. Enquanto ele explanava sobre as oscilações de pH na rede de monitoramento instalada no rio Mucuri, houve a intervenção da platéia sobre a qualidade dos efluentes industriais e sua possível correlação com a mortandade de peixes que vem ocorrendo, principalmente a partir de 2007. Este período coincidiu quando a fábrica expandiu sua produção. A CEPEMAR vem fazendo o controle e monitoramento mensal da qualidade da água (MQA) e trimestral das comunidades de peixes e invertebrados desde 1992, todavia, ficamos sem entender o motivo que levou a consultora não apresentar uma análise da série histórica dos últimos 17 anos.
Segundo relatos de pescadores da orla marinha e zona estuarina de Mucuri, vem ocorrendo mudanças na estrutura e composição da ictiofauna, notadamente alterações no tamanho das espécies capturadas, ausência de algumas espécies e peixes com feridas no tegumento. Ainda informaram que a pesca hoje só é possível em biótopos a montante do local de despejo dos efluentes industriais.
Os dados limnológicos apresentados pela Cepemar foram pontuais e inconsistentes para maiores considerações no momento (diagnose realizada com dados somente de pH e coliformes fecais de 2008). Diante dos fatos, achamos pertinente o planejamento e organização de um Seminário, em audiência pública, com análises conclusivas de toda série temporal dos dados até agora coletados pela empresa e consultoras envolvidas até então. Os dados apresentados sobre coliformes fecais apontaram um alto índice no rio Mucurizinho, este ponto de coleta fica próximo ao local de captação de água da cidade, demonstrando um grave problema de saúde pública e a necessidade urgente da empresa comunicar as autoridades municipais competentes e/ou empresa de saneamento básico local, para que sejam tomadas as medidas corretivas cabíveis.
Outra informação preocupante foi à expansão da produção da Unidade Fabril de Mucuri a partir de 2007. O rio Mucuri passou a receber uma carga muito maior de efluentes, de acordo com os técnicos foi utilizado um modelo matemático que comprova o rio suportar este excedente da carga de efluentes, entretanto vemos com cautela essas informações, é necessária a aplicação de novos modelos de simulações que possam comprovar esses dados.
Sobre as questões sociais levantadas foi geral o descontentamento, muito participantes reclamaram do empobrecimento da cidade, diminuição do comércio e turismo, desvalorização dos imóveis e o aumento do desemprego, principalmente para os jovens. De acordo com informes da empresa já foram investidos cerca de R$ 40 milhões de reais em projetos sócio-ambientais no município, porém a eficácia, execução e duração desses investimentos são discutíveis.
No período da tarde houve o reconhecimento de vários setores da fábrica, como a estação de tratamento de efluentes e o ponto de despejo destes no rio Mucuri. Participantes da visita questionaram o motivo porque os efluentes estão com coloração mais escura atualmente. Também, nenhuma resposta conclusiva nos foi apresentada nem justificada com base em parâmetros de físico-químico de água.
Podemos concluir que a reunião foi produtiva, gerando uma oportunidade para a empresa, o governo, a sociedade e o Ministério Público, tenham condições para reflexão dos problemas levantados e juntos estabelecerem novos programas sócio-ambientais eficazes de forma transparente.
Luciene Maria Kassar Borges
Mestre em Biologia



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